# 57 Nuno Azevedo
Nuno Miguel Fernandes Azevedo - Chefe de Gabinete do Presidente da C. M. de Vila Pouca de Aguiar | Fevereiro
Nome: Nuno Miguel Fernandes Azevedo
Naturalidade: Vila Pouca de Aguiar
Idade: 39 anos
Formação académica: Licenciatura em Geografia e Planeamento (Universidade do Minho - 2003; Doutoramento em Geografia (Universidade do Porto – 2011)
Ocupação Profissional: Geógrafo. De 2013 a 2021 Chefe de Gabinete do Presidente da Câmara Municipal de Vila Pouca de Aguiar
Outros: Investigador no CEGOT – Centro de Estudos de Geografia e Planeamento.
Autor de vários artigos científicos e do livro “Territórios de Baixa Densidade – o caso de Trás-os-Montes e Alto Douro”
1 - Comentário a um livro que o marcou ou cuja leitura recomende.
Em vez de evidenciar apenas um livro que me tenha marcado, gostaria de salientar que no início do meu percurso académico no curso de Geografia e Planeamento, na Universidade do Minho, me marcou o trabalho de Orlando Ribeiro, ele que foi um dos maiores geógrafos portugueses do século XX, um dos que teve mais projeção a nível internacional.
As suas obras de visão integrada e de síntese de Portugal continental, os múltiplos e minuciosos trabalhos monográficos desenvolvidos ao nível regional, entre muitas outras investigações que realizou, por vezes em colaboração com prestigiados geógrafos internacionais, tornam Orlando Ribeiro um bom exemplo de um geógrafo que dedicou a sua vida à Geografia, do ensino à ciência.
Reconheço que essa influência me poderá ter sido transmitida pelos professores que lecionavam na licenciatura, porém constato que o seu pensamento e visão sobre Portugal e a sua abrangente perspetiva da geografia portuguesa, bem patente na sua obra-prima “Portugal. O Mediterrâneo e o Atlântico”, tornam-se mais aliciantes e “encantadores” para um estudante de geografia, interessado pelo território e pelas suas múltiplas dinâmicas.
De facto, Orlando Ribeiro apresenta-nos uma visão mais integradora da geografia portuguesa, consagrada nos aspetos da geografia física e humana. Num dos trabalhos realizados, em colaboração com o geógrafo alemão Hermann Lautensach, apresenta a Geografia de Portugal entendida na sua multiplicidade de aspetos, da posição geográfica ao território, as características biofísicas, clima e paisagem, passando pelo povo português nas suas múltiplas componentes, bem como a caraterização das componentes socioeconómicas, incluindo organização / divisão regional, tantas vezes objeto de reflexão ao nível nacional.
O seu trabalho permite-nos perceber a multiplicidade de temáticas que abrange a Geografia e a sua pertinência no passado, no presente e, acima de tudo, no futuro, demonstrando a sua vivacidade.
2 - Que significado e que relevância tem, no que fez e no que faz, assim como no dia-a-dia, ser geógrafo?
Em termos profissionais, em 2004, iniciei a atividade profissional no Grupo de Estudos Territoriais (GETER) da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, colaborando na revisão e elaboração de diversos instrumentos de gestão territorial e num vasto leque de estudos e relatórios técnicos. Na realidade, tive o privilégio de iniciar o meu percurso profissional num grupo de trabalho relacionado com o território e as dinâmicas territoriais, que permitiu desde logo, participar em múltiplos trabalhos de planeamento territorial, ao nível regional (PROT), municipal (PDM) ou setorial (ex. cartas educativas, planos de mobilidade, etc.). Durante vários anos tive o privilégio de integrar equipas multidisciplinares, nas quais é possível reconhecer o papel relevante tido pela Geografia, particularmente no planeamento territorial e nas suas múltiplas fases, desde a caracterização, análise e diagnostico, à conceção de soluções de planeamento integrado (por exemplo Planos Diretores Municipais), bem como em intervenções mais específicas (por exemplo a produção de cartas de equipamentos, como a Carta Educativa, ou planos sectoriais, como sejam planos de mobilidade sustentável).
Mas integrar a equipa responsável pela elaboração do Plano Regional de Ordenamento do Território de Trás-os-Montes e Alto Douro, determinado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 124/2003, seria fundamental para o meu percurso seguinte ao nível de investigação e de elaboração da tese de doutoramento. De facto, o conhecimento sobre a região foi motivador para desenvolver a investigação sobre os territórios de baixa densidade.
Mais recentemente, no âmbito das funções de planeamento, programação, desenvolvimento, execução, acompanhamento e coordenação de atividades ao nível municipal (e intermunicipal), todo o conhecimento adquirido e acumulado, como geógrafo, é, do meu ponto visto, determinante para um bom desempenho de funções.
3 - Na interação que estabelece com parceiros no exercício da sua atividade, é reconhecida a sua formação em Geografia? De que forma e como se expressa esse reconhecimento?
Da convivência científica e técnica com outros colegas, quer da geografia quer de outros ramos do conhecimento, em virtude do trabalho em projetos de investigação, através de prestação de serviços à comunidade ou por via das funções desempenhadas ao nível intermunicipal (comunidade intermunicipal, empresa intermunicipal) e municipal (autarquia local), tenho a perceção que a geografia é reconhecida pela sua abrangência multidisciplinar, possibilitando uma agregação e sistematização temática integradora. No meu caso concreto, julgo que tenho conseguido que a minha formação em geografia contribua para ser uma mais-valia nas equipas que tenho integrado.
4 - O que diria a um jovem à entrada da universidade a propósito da formação universitária em Geografia, sobre as perspetivas para um geógrafo na sociedade do futuro? E a um geógrafo a propósito das perspetivas, responsabilidades e oportunidades?
Em primeiro lugar gostaria salientar que um jovem, aquando da entrada no percurso académico universitário, deve focar-se na multidisciplinaridade da geografia e nas possibilidades que esse conhecimento lhe poderá proporcionar no futuro, sobretudo se conseguir sustentar o seu pensamento geográfico numa visão integradora e humanista, de forma a poder contribuir, por exemplo, para o desenho e construção de políticas públicas de coesão e de desenvolvimento territorial integrado.
É importante que o geógrafo, nomeadamente enquanto estudante, mas também enquanto profissional, assente as suas abordagens empíricas numa perspetiva construtivista e não em representações negativistas (associadas por vezes a “fim”, “morte” ou “abandono”), as quais estão frequentemente associadas a uma visão redutora e adequada para retratar os processos e as dinâmicas territoriais. Esta abordagem construtivista revela-se mais rica, ainda que complexa, uma vez que os territórios (sejam eles quais forem, rurais, urbanos, ou outros) exprimem uma diversidade e riqueza de perspetivas difíceis de serem sintetizadas. Esta foi uma das muitas “ilações”, diria lições, que tomei com a minha orientadora de doutoramento, a bem conhecida Geógrafa Teresa Sá Marques.
5 - Queríamos pedir-lhe que escolha um acontecimento recente, ou um tema atual, podendo ambos ser de âmbito nacional ou internacional. Apresente-nos esse acontecimento ou tema, explique as razões da sua escolha, e comente-o, tendo em conta em particular a sua perspetiva e análise como geógrafo.
Existem duas temáticas associadas à geografia, uma relacionada com a geografia física e outra com a geografia humana, que do meu ponto de vista, além da necessária e permanente reflexão, merecem um nível de intervenção mais objetiva.
No primeiro caso, refiro-me aquele que seja talvez o maior desafio a nível mundial, as alterações climáticas. Embora sejam conhecidas as causas e consequências deste fenómeno, julgo que a ação política neste âmbito tem ficado muito aquém daquilo que seria expetável e desejável. Esta constatação é inegável ao nível internacional, quer seja por vias do fracasso das negociações internacionais sobre as alterações climáticas e as substâncias que empobrecem a camada de ozono, seja por inação e/ou incumprimento das metas estabelecidas nos acordos que foram estabelecidos relativamente às alterações climáticas. Também a nível nacional, considero que a resposta política a este problema requer uma efetiva determinação governativa nesse sentido, visando uma ação mais concertada e assertiva, traduzida em medidas que minimizem as causas e que preparem a sociedade para lidar com os seus impactes.
O outro caso refiro-me ao envelhecimento da população que assume, do meu ponto de vista, particular preocupação em determinados territórios, nomeadamente nos territórios do interior e de baixa densidade. O envelhecimento da população é um dos maiores triunfos da humanidade, mas é também um grande desafio, sendo fundamental garantir as indispensáveis respostas de proximidade através de decisões políticas, de compromisso e solidariedade ativa entre gerações. Esta preocupação torna-se ainda mais pertinente atendendo ao momento pandémico que se vive atualmente pelo que é importante que os serviços, os equipamentos e as infraestruturas tenham capacidade de resposta a diferentes necessidades e se consigam reajustar a procuras diferenciadas.
Mais do que nunca, o envelhecimento da população traz, de forma mais vincada nos territórios do interior e de fronteira, desafios societais que é difícil reverter, sobretudo os associados à maior exigência de suporte de cuidados de saúde, o aumento dos encargos com apoio social direcionado aos idosos, a garantia da inclusão social, o acesso a serviços básicos, bem como à diminuição de efetivos em idade ativa. A necessidade de promover condições propícias ao desenvolvimento e competitividade das regiões mais vulneráveis, em termos económicos e demográficos, passa pela operacionalização de medidas que permitam também minimizar os efeitos cumulativos que a escassez de mão-de-obra pode ter nos territórios do interior.
6 - Que lugar recomendaria para saída de campo em Portugal? Porquê?
Por maioria de razão começaria por recomendar a visita a um reino maravilhoso, Trás-os-Montes e Alto Douro. Este território foi objeto de investigação no meu doutoramento e é uma referência por paixão, mas também por razão. Já dizia o poeta Miguel Torga, no Segundo Congresso Transmontano, realizado no casino das Pedras Salgadas, em 1941, que este é “Um Reino Maravilhoso”.
Os contrastes climáticos da terra fria à terra quente, um planalto profundamente sulcado por vales profundos, com altas montanhas paralelas a outras montanhas, cortadas por vales profundos e rios de água “cristalina”, tem no Rio Douro uma “marca”, e é uma região com uma história geológica “movimentada”, como diria Miguel Torga, um oásis de “rugas” geológicas. Aqui se produz o famoso vinho do Porto, os vinhos do Douro, o azeite, o mel de excelência, cultiva-se a amêndoa, a maçã, a cereja, a castanha, a batata, os cereais e os cogumelos. Os típicos enchidos, a posta maronesa, mirandesa e barrosã, os folares e diversos doces conventuais são exemplos do que pode encontrar na região.
Trás-os-Montes e Alto Douro é habitada desde a pré-história e possui um vasto património arquitetónico e cultural. Descobrir as minas de ouro de Tresminas é uma experiência única, as estâncias termais do Alto Tâmega são uma referência na saúde e bem-estar; as gravuras e pinturas rupestres, as igrejas e pontes de vários estilos arquitetónicos, os solares, os conventos e castelos, as Quintas do Vale do Douro, as cidades e os seus centros históricos e museus, as aldeias comunitárias, bem como os vários “elementos” classificados de Património da Humanidade são exemplos da diversidade cultural que pode encontrar na região.
Mais em concreto, particularizando um local, não poderia deixar de referir a minha terra natal, onde tenho a felicidade de residir – concelho de Vila Pouca de Aguiar. Para um geógrafo, esta visita seria sem dúvida muito enriquecedora, pela diversidade de realidades que pode encontrar, oferecendo locais únicos, paisagens retemperadoras, alojamento hospitaleiro e tradições vivas. Os recantos das Terras de Aguiar podem ser conhecidos através das Serras do Alvão e da Padrela onde é possível usufruir das magníficas paisagens, da natureza em estado puro, da sua biodiversidade e da autenticidade das suas gentes. No Vale de Aguiar, percorrido pela EN 2, é possível encontrar a riqueza das águas gasocarbónicas de Pedras Salgadas.
Os vários trilhos pedestres existentes propiciam uma forma de conhecer, ao seu ritmo, os principais pontos de interesse do concelho de Vila Pouca de Aguiar. Alguns exemplos do que pode visitar: Complexo Mineiro Romano de Tresminas; Centro Hípico de Pedras Salgadas; Parque Termal de Pedras Salgadas; Barragem da Falperra – Alvão; Castelo de Aguiar da Pena; Museu Municipal Padre José Rafael Rodrigues; bem como o Caminho de Santiago e a Rota da EN2. Os dólmens no Alvão reportam para uma história milenar.
Percorra Vila Pouca de Aguiar e deixe-se encantar…